segunda-feira, 7 de maio de 2007

Fim... De noite.

O som de seu sapato junto a calçada ao andar me lembrava Comptine d'Un Autre Été, eu teria dito isso se soubesse pronunciar ou quisesse pronunciar algo. Tínhamos um pacto, éramos duas almas errantes que acertavam compromissos distantes, possuíam o dom de amar cinema, um copo de vodka e meia dúzia de frases ditas que esqueceríamos com o tempo, assim como nossas promessas, sonhos vazios e momentos de cumplicidade.
-Um dia, te roubo e vamos morar na Suécia... Quero ser uma sueca que coleciona selos. Você me acharia bonita coberta de casacos?
-Você não ficaria coberta de casacos ao meu lado.
Sorrimos...
Alguns instantes atrás eu a tive em meus braços, sua pele era branca como o leite, seus lábios eram doces, eu sabia que o desejo era algo que crescia dentro de mim como veneno. Sabia que tudo iria se perder se eu quisesse possuí-la, que tudo seria clichê, não seria mais nosso.
-Posso acompanha-la até em casa?
-Não é necessário, esse horário a rua esta acesa, os vizinhos cintilantes por uma fofoca e os guardas sempre passam por lá.
-Eu realmente gostaria de acompanha-la.
Ela me olhou com a indagação “por que?” presa em cada ponto de seus olhos.
-Se você preferir... Mas saiba que eu nunca faria isso por você.
Baixo os olhos, e imagino porque ela diria isso, ela era a esfinge e eu precisava decifrá-la. Fiquei mudo, apenas ouvindo o som de seus sapatos que se tornavam mais rápidos, talvez fosse a hora... Naquele instante vi em seu sorriso palavras que ela não iria dizer, momentos que não iríamos viver, calei-me e não foi necessário dizer mais nada. Ela, como poucas, entendia meu silêncio em meio aos seus gestos.
-Você quer me acompanhar pra descobrir onde moro?
-Não, apenas quero fotografar seu sorriso em minha mente várias vezes, só pra ter certeza todos os dias ao acordar que já me encontrei.
Silêncio novamente.
-Daqui em diante vou sozinha, até mais.
-Até mais, você conhece o caminho de minha casa, volte quando quiser.
Sorriu...
Fiquei lá, parado, ouvindo Comptine d'Un Autre Été se afastar. Ambos sabíamos que ela iria sumir sem dizer onde ou porquê. Isso era ela deixando de ser nós pelos seus ideais.
E entre minhas correspondências:
“Tenho em você um vilão, você me rouba as melhores horas do dia, só ao seu lado posso tê-las. Quero que seja paciente e leia tudo com atenção. Juntos seriamos aquele típico casal. Aquele que descrevemos quando nos conhecemos, e que eu quero fugir. Eu poderia te fazer todas as declarações, mas seriam tão falsas. E nunca te enganei, você sempre soube. O beijo não seria sincero e muito menos o sorriso. Eu posso te dar tudo menos amor, posso te dar meu afeto, meu ombro e minhas noites de gafes e estado etilicamente alterado, poderia te dar todos os meus livros... Mas não me peça mais isso, seria sua amiga, riria da sua cara de bravo ao me ver desligada do mundo, e saberia o que te dizer quando me cobrasse atenção e me pedisse pra te olhar nos olhos, mas não quero lidar com isso, não posso lidar com isso! E você me entende, e o mais importe, sei que você compreende. “Somos pássaro novo longe do ninho, lembra?”. Você agora busca algo que diverge do que quero, e nosso tempo acabou. Saiba que dentro de tudo, não te amei, mas em segundos restritos, sentia em meu sangue resquícios do teu. Tenho medo do que seremos no futuro, e não quero mais ter medo. Adeus. Ass.: A. T.”

Nenhum comentário: